Proposta de LDO/2025 de Tarcísio de Freitas sinaliza mais ataques contra a educação pública e ao conhecimento

Proposta de LDO/2025 de Tarcísio de Freitas sinaliza mais ataques contra a educação pública e ao conhecimento

Após recuar da investida contra as universidades, governo mantém possibilidade de confisco nas verbas da Fapesp. Fórum das Seis defende emendas pela volta da expressão ‘no mínimo’, por mais recursos para as universidades e o Centro Paula Souza e pela garantia do orçamento da Fapesp 

Está tramitando na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) o projeto de lei (PL) 302/2024, contendo as propostas do Executivo para a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2025. É na LDO que se definem os recursos que cada setor receberá no orçamento do próximo ano, entre eles as universidades estaduais paulistas, o Centro Paula Souza e a Fapesp.

O PL 302 chegou à Alesp em 3/5 e, de imediato, fez acender o alerta nas universidades. No artigo 5o, Tarcísio de Freitas (Republicanos) embutiu uma “novidade”. No percentual destinado à Unicamp, à USP e à Unesp (9,57% do ICMS - Quota-parte do Estado), foram inseridas a Faculdade de Medicina de Marília (Famema), a Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (Famerp) e a Universidade Virtual do Estado de São Paulo (Univesp). Isso significaria uma expressiva redução nos recursos para as estaduais paulistas em 2025.

Frente à reação das entidades representativas, dos reitores e de vários setores da sociedade, que repercutiu na imprensa, Tarcísio anunciou o recuo ainda no mesmo dia e enviou à Alesp uma mensagem modificativa, publicada no dia 6/5 no Diário Oficial.

O fato deixou clara a intenção do atual governo de confiscar recursos da educação superior pública paulista e atacar a autonomia das universidades, prevista no Decreto nº 29.598, de fevereiro/1989. De acordo com o decreto, Unesp, Unicamp e USP passaram a contar com dotação orçamentária própria, inicialmente de 8,4% do ICMS-QPE, percentual que foi ampliado nos anos seguintes, resultado das lutas da comunidade acadêmica, chegando aos 9,57% vigentes até hoje.

O desejo de acabar com a autonomia e confiscar recursos das universidades não é de hoje, mas ganha tons mais ameaçadores no governo atual. Nada impede que a base bolsonarista do governador na Alesp leve adiante a tentativa de alterar o artigo 5º durante a tramitação do PL 302/2024 na casa. Além disso, mais uma vez, a proposta de LDO chega à Alesp sem a expressão “no mínimo” antes dos 9,57% do ICMS/QPE, o que precisa ser alterado. O Fórum das Seis, como de costume, enviou propostas de emendas a todos os mandatos na Alesp, prevendo a recolocação da expressão e, também, a destinação de mais recursos para as universidades, ao Centro Paula Souza e ao conjunto da educação pública (veja no box), além de uma emenda voltada à Fapesp. 

Ataque à Fapesp

No PL 302, há um dispositivo que pode levar a um corte de cerca de 30% do orçamento previsto para a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de SP (Fapesp), que é de 1% das receitas tributárias do estado, conforme previsto na Constituição paulista.

A artimanha tem base em um instrumento previsto na Emenda Constitucional (EC) 132, que instituiu a reforma tributária no ano passado. Diz o dispositivo que “são desvinculados de órgão, fundo ou despesa, até 31 de dezembro de 2032, 30% (trinta por cento) das receitas dos Estados e do Distrito Federal relativas a impostos, taxas e multas já instituídos ou que vierem a ser criados até a referida data, seus adicionais e respectivos acréscimos legais, e outras receitas correntes”.

Em nota, o governo reagiu às queixas externadas, novamente, por vários setores da sociedade – como as entidades sindicais e acadêmicas, o Conselho de Reitores das Universidades Estaduais Paulistas (Cruesp) e até a Federação das Indústrias (Fiesp) – afirmando que se trata apenas de uma adequação do texto da LDO às alterações trazidas pela reforma tributária.

“O dispositivo aponta que haverá um anexo próprio na Lei Orçamentária Anual demonstrando o cumprimento da vinculação de receita da Fundação. O debate sobre a alocação e efetivação da dotação é realizado no âmbito do envio da Lei Orçamentária Anual de 2025 à Assembleia Legislativa, que ocorre em setembro. Não há previsão de utilização deste dispositivo até o momento”, diz o Executivo.

Obviamente, o perfil retrógrado e hostil aos serviços públicos e à educação, exposto em inúmeras iniciativas – como a recente aprovação na Alesp, sob bombas e cassetetes da tropa de choque contra os manifestantes, da criação de “escolas cívico-militares” no estado – não garante nenhum crédito ao que diz a nota do governo.

“Trata-se de uma medida politicamente tola, pois pode levar à deterioração da pesquisa no estado e no país, o que terá reflexos diretos no desenvolvimento social e econômico”, lamentou Renato Janine Ribeiro, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), durante audiência pública realizada em 21/5, na Alesp, pela Frente Parlamentar em Defesa das Universidades e Institutos Públicos de Pesquisa.

A audiência contou com representantes das reitorias de universidades públicas (USP, Unesp, Unicamp, Instituto Federal de SP, Unifesp), representantes da Fapesp, de órgãos acadêmicos e científicos, entidades sindicais e estudantis. “A ameaça de corte é puro negacionismo da ciência”, criticou Dora Colariccio, vice-presidenta da Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de SP (APqC). Nas várias falas que se seguiram, foram citados exemplos de pesquisas relevantes impulsionadas pela Fapesp, como o projeto Genoma, as vacinas, o combate ao câncer, os estudos sobre as mudanças climáticas, entre outros.

Falando em nome do Fórum das Seis, a presidenta da Adusp, Michele Schultz, lembrou que este é apenas um dos muitos ataques que a educação e a pesquisa públicas vêm sofrendo nos sucessivos governos paulistas. Ela citou como exemplo o projeto aprovado pela Alesp em 2020, enviado pelo então governador João Doria, que levou ao fechamento de seis órgãos públicos, entre eles a Superintendência de Controles de Endemias (Sucen); o projeto previa cortes de recursos das universidades estaduais e da Fapesp, mas a medida foi revertida pouco antes da votação.

“É importante reagirmos a mais este ataque, reafirmando a defesa de financiamento público para a educação e a pesquisa, e que estas sejam socialmente referenciadas nos interesses da população e não do mercado”, pontuou.

A deputada Beth Sahão (PT), coordenadora da Frente, informou que já havia protocolado emenda ao projeto de LDO/2025, para manter intactos os recursos previstos para a Fapesp. Outros mandatos da oposição também apresentaram emendas no mesmo sentido.310524b2

.......................

Fórum das Seis encaminhou emendas

Como faz todos os anos, o Fórum das Seis apresentou propostas de emendas à Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO/2025), em tramitação na Alesp.

O recuo do governador da tentativa de inserir outras instituições no mesmo orçamento previsto para as universidades estaduais paulistas não significa que o projeto esteja isento de problemas. No PL 302 não consta nem mesmo a expressão “no mínimo” antes do percentual de 9,57% do ICMS Quota-Parte do Estado destinado às universidades estaduais. Vale lembrar que, a partir do início dos anos 2000, as universidades estaduais passaram por uma expressiva expansão de vagas, cursos e campi, mas em nenhum momento o percentual de repasse de recursos foi alterado, apesar das muitas promessas feitas pelo governo. A reivindicação do Fórum na LDO 2025 é de aumento de recursos: há emendas prevendo alíquotas de 10% até 11,6% do ICMS – QPE, sempre sobre o “total do produto”, com o objetivo de evitar o sequestro de recursos na nossa base de cálculo (veja mais detalhes nos boletins do GT Verbas).

Para o Centro Paula Souza (Ceeteps), autarquia pública estadual que mantém as escolas técnicas (ETEC) e faculdades de tecnologia (FATEC), mais uma vez não há dotação fixa prevista (o governador define a cada ano o quanto quer destinar ao órgão). As emendas do Fórum pleiteiam a dotação de 3,3% do total do produto do ICMS-QPE).

Para o conjunto da educação pública, o pleito é de 33% do total de receitas do estado.

Há também uma proposta de emenda relativa à Fapesp, prevendo a retirada do trecho que permite ao governo cortar até 30% dos recursos do órgão.

As emendas do Fórum foram protocoladas por parlamentares do PT, do PSOL e do PcdoB. A tramitação do PL 302 prevê a definição do/a relator/a do projeto da Comissão de Finanças, Orçamento e Planejamento (CFOP), que fará seu relatório. A votação final cabe ao plenário da Alesp e deve ocorrer até final de junho.

Neste processo, é importante pressionarmos os/as parlamentares pela aprovação das nossas emendas. Fique de olho nos chamados da sua entidade.

.......................

Aumento de renúncia fiscal e reforma tributária

O projeto de LDO/2025 enviado pelo Executivo à Alesp prevê um expressivo aumento de renúncias de receita (desonerações e isenções concedidas a empresas) para o próximo ano. O PL 302 indica R$ 71,5 bilhões em renúncia fiscal no estado de São Paulo em 2025, o que é 12% superior ao previsto para 2024. Nos quatro anos de governo Tarcísio, a estimativa é de R$ 298 bilhões em renúncia. Trata-se de um volume gigantesco de recursos que deixarão de entrar nos cofres públicos e que poderiam ser usados para ampliação e melhorias dos serviços prestados à população, inclusive para o financiamento das universidades.

O PL 302 também não faz menção ou previsão de possíveis efeitos da reforma tributária no orçamento. “Ao elevar renúncia de receita sem projetar os fundos de compensação que passarão a valer em 2025, o governo contribui para que haja redução no orçamento do estado”, avalia documento enviado pelo Fórum das Seis aos/às parlamentares, contendo as emendas em prol de mais recursos para as universidades, o Centro Paula Souza e o conjunto da educação pública.

.....................

Tarcísio recua e retira PEC 9 da Alesp. Intenção é aprovar após as eleições

O governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) indicou à Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJR) da Assembleia Legislativa que retire de tramitação a proposta de emenda constitucional (PEC) 9/2023, que prevê a redução da verba orçamentária destinada à educação pública dos atuais 30% para 25% das receitas do estado.

O recuo do governador, como assinalam matérias na imprensa, visa evitar o desgaste causado pela resistência dos sindicatos e movimentos sociais à aprovação da medida, especialmente nos meses que antecedem as eleições municipais deste ano. A avaliação é que o projeto volte a tramitar em novembro.

Caso aprovada, a PEC 9 implicará numa perda anual de cerca de R$ 10 bilhões nos recursos da educação pública, o que afetaria drasticamente a rede pública de educação básica, o Centro Paula Souza e as universidades estaduais. Será essencial manter e ampliar a mobilização contra mais este ataque.