Pouco depois do término da sessão do Conselho Universitário (CO) da Unesp no dia 22 de fevereiro, já no início da noite, o site da instituição divulgava matéria sobre o principal tema da reunião: a proposta de resolução intitulada “Parâmetros de sustentabilidade orçamentária e financeira da Unesp” (item 7 da pauta). Na matéria, afirma-se que o documento está “alinhado com o Plano de Gestão da atual reitoria, que busca romper com práticas passadas e promover o diálogo responsável para garantir a sustentabilidade da Universidade”.
O que ocorreu até o momento, infelizmente, está muito longe de ser nomeado de “diálogo responsável”. A retirada do documento da pauta do CO de 22/2, como veremos a seguir, foi fruto da rejeição e das críticas da maioria dos conselheiros presentes. Na véspera, o reitor Sandro Roberto Valentini havia se reunido com o Fórum de Diretores, para expor-lhes as propostas. Logo de início do CO, no entanto, a intervenção da presidente deste Fórum, professora Elaine Maria Sgavioli Massucato, da FO-Araraquara, sinalizou claramente que não havia consenso para a aprovação imediata.
Neste boletim, a Adunesp apresenta uma descrição sucinta dos debates e encaminhamentos da sessão do CO de 22/2, elaborada a partir dos relatos e avaliações dos membros do “Chapão da Adunesp” neste colegiado e do representante do Sindicato na reunião, o professor Fábio Ocada (direito a voz). Após a Plenária da Adunesp, agendada para 28/2, em Rio Claro, novo boletim fará uma avaliação mais minuciosa e técnica da proposta da reitoria.
O Início
A reunião do CO iniciou-se com uma exposição do pró-reitor de Pós-graduação, professor João Lima Sant Anna Neto, acerca da situação atual e perspectivas futuras para os Programas de pós-graduação da Unesp, seguido da posse do novo representante da FAPESP, professor Eduardo Moacyr Krieger, e de uma exposição do Assessor de Planejamento Estratégico Rogério Buccelli, sobre a situação orçamentária e financeira da Unesp.
Já na palavra dos conselheiros, as primeiras manifestações da presidente do Fórum dos Diretores, bem como de outros membros do CO, mostraram-se favoráveis à retirada do item 7 da pauta. No período da tarde, seguiu-se uma exposição do professor Álvaro Guedes, assessor da Pró-reitoria de Planejamento Estratégico e Gestão (PROPEG), que se limitou a uma breve explicação sobre os gráficos por ele selecionados e apresentados na minuta de resolução defendida pela reitoria.
Quem assistiu à transmissão da reunião do CO – ao vivo, pela TV Unesp – pôde ver que as falas dos conselheiros em relação à apresentação foram contundentes, seja no sentido de apontar para a excessiva austeridade contida na proposta, seja em razão da má qualidade do documento apresentado. Todas as falas apontaram no sentido da retirada de pauta do referido item.
Ao tomar a palavra, o representante da Adunesp, professor Fábio Ocada, registrou o protesto do Sindicato em relação à forma aligeirada como foi feito o encaminhamento da minuta, bem como em relação ao seu conteúdo, exposto de forma confusa, incompleta e propondo em linhas gerais que docentes e servidores técnico administrativos, há mais de três anos sem reajustes salariais, paguem pelos equívocos cometidos pelas sucessivas gestões reitorais. Ele também fez um apelo para que a atual reitoria cesse com o comportamento subserviente em relação ao governador do estado, uma vez que esse padrão de conduta constitui o fator determinante do atual colapso financeiro vivenciado pela instituição. Uma vez eleito pela comunidade acadêmica, o reitor deveria levar as demandas da Universidade para o Palácio dos Bandeirantes, e não se portar como um interventor do governo no seio da comunidade acadêmica.
Em relação às críticas realizadas, o reitor manifestou-se assumindo a responsabilidade pela inclusão de última hora do item 7 na pauta do CO, mas rebateu com veemência a afirmação de que estaria assumindo uma posição de subserviência frente ao governo e à Assembleia Legislativa (Alesp), o que evidentemente não se sustenta ao se considerar o teor da proposta de reestruturação apresentada.
Membros do “Chapão da Adunesp” no CO fizeram várias intervenções. A professora Maria do Rosário Longo Mortatti, da FFC-Marília, por exemplo, reforçou a deliberação da Congregação daquela unidade, contrária à aprovação do documento, e fez questionamentos relativos à forma de encaminhamento da proposta e sua discussão, com os mesmos equívocos e armadilhas que ocorreram nos encaminhamentos relativos à “proposta de avaliação” apresentada pela CPA em 2017. Ela também qualificou como “recessiva e repressiva” a proposta de resolução da reitoria, análoga a recentes medidas desse tipo nos âmbitos federal e estaduais. Em relação à resposta dada pelo reitor quando questionado sobre a situação do dissídio dos trabalhadores da Unesp – ele disse que a “decisão sobre dissídio não é nossa, mas sim do Cruesp, e o compromisso do CO é construir parâmetros para a expansão da Unesp” – a professora Maria do Rosário ponderou que o reitor segue o Cruesp somente quando lhe convém, já que, por exemplo, não tivemos o reajuste de 3% em 2016.
Metas e métricas
O professor Maurício Delamaro, do campus de Guará e membro do “Chapão da Adunesp”, questionou a afirmação de que a minuta da reitoria seria fruto de um “planejamento estratégico”. Ele lembrou que qualquer planejamento estratégico envolve metas, que são a soma de uma métrica + um tempo de previsão. Como exemplo: “vacinar 10 milhões de pessoas em 2 meses”.
Para ele, o que temos na proposta da reitoria não é uma meta, mas apenas uma métrica (os 85%). Além disso, qualquer planejamento estratégico elenca as ações a serem implementadas para se atingir as metas, o que não está presente na proposta da reitoria.
Frente à constatação de que a proposta da reitoria se resume a uma métrica, Delamaro lembrou que é fundamental diferenciar os recursos importantes dos recursos essenciais. Na universidade, há muitos tipos de recursos importantes – prédios, laboratórios, carros, microscópio etc. Mas há apenas um recurso essencial: são as PESSOAS! A fixação da métrica em 85% é desprezar as pessoas! Funcionários e alunos. Por isso, essa métrica nesse valor é estrategicamente equivocada. O nome desse equívoco é injustiça.
Para o professor, a proposição dessa métrica é também inoportuna, pois desconsidera o momento histórico e a história recente. Desconsidera que as dificuldades financeiras atuais são frutos das expansões bem negociadas pelo Palácio e mal negociadas pelas gestões reitorais anteriores.
A fixação da métrica tal como proposta é, sim, inoportuna e injusta. Mas tem mais: pode ser suicida. A sustentabilidade dos sistemas (ou das organizações) é, sempre multidimensional. “Privilegiar uma única dimensão em detrimento das outras pode colapsar todo o sistema. Privilegiar, neste momento, a dimensão financeira em detrimento do “fator humano” (as pessoas!) pode ser catastrófico”, alerta.
Próximos passos
Ao final da reunião, não sem algumas pressões, o reitor se comprometeu com uma agenda que prevê o envio da minuta às unidades para “contribuições” e realização de uma sessão extraordinária do CO em fins de março ou início de abril.
A Adunesp considera que o desfecho da reunião de 22/2 foi positivo, pois a postura da maioria dos conselheiros impediu que o documento fosse votado ali mesmo, como aparentava ser a intenção inicial do reitor. No entanto, o embate está apenas no início.
Considerando as sérias implicações da proposta da reitoria, é preciso que a comunidade (estudantes, servidores docentes e técnico-administrativos) se envolva amplamente neste debate e no enfrentamento para impedir retrocessos na Universidade. É necessário que as diretorias locais convoquem congregações abertas, estimulando a participação de todos.
Às suas subseções e representantes de base, a Adunesp orienta a realização de assembleias (precedendo as congregações, se tiverem sido convocadas) para discutir a minuta da reitoria e os encaminhamentos para construir a resistência em defesa da Unesp. O indicativo é aproveitar o calendário de assembleias da data-base 2018 (a primeira rodada está indicada para o período de 1 a 15 de março) e também debater a minuta.
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O que prevê a minuta da reitoria
Numa redação confusa e dúbia, a minuta “Parâmetros de sustentabilidade orçamentária e financeira da Unesp” estabelece:
- O limite de 85% de comprometimento da cota-parte do ICMS para Unesp com despesas de pessoal e reflexos, ou seja, com a massa salarial;
- Os repasses da Lei Kandir e dos programas especiais de parcelamento deixam de fazer parte do orçamento da Universidade para efeito de cálculo das despesas de pessoal e reflexos, e serão “destinados para constituir reserva financeira, até atingir o valor equivalente a, no mínimo, quatro vezes o dispêndio mensal com folhas e reflexos”.
- Destinar o crescimento nominal do ICMS (cota-parte base para a Unesp) do período de 12 meses para pagar as despesas com pessoal e reflexos, incluindo a folha de inativos, quinquênio e sexta-parte; garantir a execução das demais despesas; e recompor a reserva financeira.
- Destinar 100% dos recursos correspondentes ao crescimento real do ICMS (cota-parte base para a Unesp), com base nos últimos 12 meses, a novas contratações e à recomposição salarial, até o limite de comprometimento de 85% da cota-parte do ICMS.
Em suas simulações, a reitoria da Unesp estima que o comprometimento de 85% será alcançado em 2023 e que a reserva financeira chegará aos valores desejados em 2026.