Reforma da Previdência - Ação da Adunesp questiona alíquotas progressivas e mudança na base de cálculo dos aposentados e pensionistas

Reforma da Previdência - Ação da Adunesp questiona alíquotas progressivas e mudança na base de cálculo dos aposentados e pensionistas

A Assessoria Jurídica (AJ) da Adunesp ajuizou ação ordinária com pedido de tutela provisória de urgência questionando itens centrais da reforma da Previdência implantada pelo governo paulista em março de 2020, que afeta diretamente os servidores autárquicos ativos e inativos da Unesp. Os principais pontos questionados relacionam-se à alíquota progressiva e à ampliação da base de cálculo que levou à tributação extra dos aposentados e pensionistas.

A ação, que leva a assinatura das advogadas Lara Lorena Ferreira, Paula Nocchi e Luísa Stopassola, foi impetrada junto à 3ª Vara da Fazendo Pública de São Paulo em 17/7/2020, sob o número 10349375920208260053. A autorização para esta ação foi dada pela Plenária Estadual da Adunesp realizada em 16/7/2020.

A reforma da Previdência paulista foi aprovada na Assembleia Legislativa neste ano e sancionada pelo governador João Doria, transformando-se na Emenda Constituição (EC) nº 49 e na Lei Complementar (LC) nº 1.354, ambas de 6/3/2020. A EC 49/2020 alterou parcialmente o texto da Constituição Estadual e a LC 1.354 trouxe o detalhamento das novas regras de previdência, modificando a redação da LC 1.012/2007. Posteriormente, em 19/6/2020, o governo editou o Decreto nº 65.021/2021, que impõe aumento adicional na contribuição de aposentados e pensionistas. Todas as medidas adotadas no estado de São Paulo são decorrentes da reforma aprovada pelo Congresso Nacional, em novembro de 2019, que culminaram na EC nº 103, de 12/11/2020.

Em extensa argumentação legal, a AJ da Adunesp aponta a inconstitucionalidade das medidas, com base em garantias previstas na carta magna.Dentre os argumentos elencados, estão a impossibilidade de abusividade fiscal, uma vez que o estado não demonstra o déficit alegado, bem como de confisco, irredutibilidade salarial, quebra de isonomia, entre outros. “A presente ação visa o afastamento da confiscatória majoração da alíquota previdenciária promovida sobre os servidores integrantes da categoria aqui sintetizada, pois instituiu progressividade abusiva, sem a criação de benefícios correspondentes ao aumento e sem a consideração atuarial da situação superavitária decorrente das elevadas contribuições”, resume a inicial da ação.

As alíquotas progressivas

A instituição das alíquotas progressivas foi um dos pontos centrais da reforma paulista. Variando de 11% a 16%, e incidindo por faixas salariais, representou um aumento expressivo na contribuição previdenciária de servidores ativos e inativos. Este item aparece na LC 1.354/2020, da seguinte forma:

“Artigo 8º - A contribuição social dos servidores públicos titulares de cargos efetivos do Estado de São Paulo, inclusive os de suas Autarquias e Fundações, do Poder Judiciário, do Poder Legislativo, das Universidades, do Tribunal de Contas, do Ministério Público e da Defensoria Pública, para a manutenção do Regime Próprio de Previdência Social, será:

I - 11% (onze por cento) até 1 (um) salário mínimo, enquanto a do Estado será de 22% (vinte e dois por cento), ambas incidindo sobre a totalidade da base de contribuição;

II - 12% (doze por cento) de 1 (um) salário mínimo até R$ 3.000,00 (três mil reais), enquanto a do Estado será de 24% (vinte e quatro por cento), ambas incidindo sobre a totalidade da base de contribuição;

III - 14% (quatorze por cento) de R$ 3.000,01 (Três mil reais e um centavo) até o teto do Regime Geral de Previdência Social - RGPS, enquanto a do Estado será de 28% (vinte e oito por cento), ambas incidindo sobre a totalidade da base de contribuição;

IV - 16% (dezesseis por cento) acima do teto do Regime Geral de Previdência Social - RGPS, enquanto a do Estado será de 32% (trinta e dois por cento), ambas incidindo sobre a totalidade da base de contribuição.

(...)

§ 7º - A alíquota prevista neste artigo será aplicada de forma progressiva sobre a base de contribuição do servidor ativo, incidindo cada alíquota sobre a faixa de valores compreendida nos respectivos limites.

§ 8º - Excetuados os valores do salário mínimo e do teto do Regime Geral de Previdência Social - RGPS, os demais valores de que tratam este artigo serão reajustados conforme variação da unidade fiscal do Estado de São Paulo - UFESP.”

 “Artigo 31 - O artigo 9º da Lei Complementar nº 1.012, de 5 de julho de 2007, passa a vigorar com a seguinte redação:

 “Artigo 9º - Os aposentados e os pensionistas do Estado de São Paulo, inclusive os de suas Autarquias e Fundações, do Poder Judiciário, do Poder Legislativo, das Universidades, do Tribunal de Contas, do Ministério Público e da Defensoria Pública, contribuirão conforme o disposto no artigo 8º desta lei complementar, sobre o valor da parcela dos proventos de aposentadorias e pensões que supere o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social.

§1º - Nos casos de acumulação remunerada de aposentadorias e ou pensões, considerar-se-á, para fins de cálculo da contribuição de que trata o “caput” deste artigo, o somatório dos valores percebidos, de forma que a parcela remuneratória imune incida uma única vez.

§2º - Havendo déficit atuarial no âmbito do Regime Próprio de Previdência do Estado, a contribuição dos aposentados e pensionistas de que trata o “caput”, incidirá sobre o montante dos proventos de aposentadorias e de pensões que supere 1 (um) salário mínimo nacional.”

Para as advogadas da Adunesp, não resta dúvida de que as medidas violam os direitos constitucionais que garantem o contribuinte contra a abusividade fiscal, protegidos pelo rol das cláusulas pétreas, como é o caso da “irredutibilidade dos subsídios”, da “vedação ao confisco tributário”, da “impossibilidade de discriminação pela atividade exercida”, da “exigência de estudo atuarial”, entre outros.

Diz a ação: “O que se tem é o aumento substancial das alíquotas de contribuição previdenciária, incidentes sobre expressivo montante remuneratório dos servidores públicos, sem a comprovação atuarial de que seus benefícios são a causa do alegado déficit previdenciário e, principalmente, sem a consideração de que parcela expressiva de seus subsídios serão consumidos por tributação (podendo ser mais, se instituídas as contribuições extraordinárias), dada a cobrança simultânea do Imposto de Renda e todos os demais impostos.”

Exemplificando a argumentação, a ação da Adunesp pondera que a fixação de, no caso, até 16% de contribuição previdenciária (caso não sejam instituídas as contribuições extraordinárias ou ampliadas as bases de cálculo), somada aos 27,5% de Imposto de Renda, demonstra que até 43,5% dos rendimentos dos servidores públicos poderão ser consumidos por tributação. Isso, adicionado à taxação sobre o consumo, demonstra que a carga tributária global suportada poderá devorar mais da metade da remuneração!

Citando a irredutibilidade prevista no inciso XV do artigo 37 da Constituição Federal, a ação conclui que  a abusiva majoração das alíquotas se dá apenas em razão das remunerações dos servidores, em contrariedade à limitação do poder de tributar tratado no inciso II do artigo 150 da Constituição, com intenção ilegítima de reduzir-lhes os salários, o que causa efeitos diretos e perversos sobre a irredutibilidade de vencimentos.

Ainda nesta linha, a ação assinala que esse tratamento desigual também se destaca em razão de a norma afetar notadamente aqueles servidores que ingressaram no serviço público anteriormente à instituição do Regime de Previdência Complementar, “haja vista que a eles, desde que não optem pela adesão, não se aplica o limitador da contribuição equivalente ao teto do regime geral”.

Ausência de estudo atuarial

De acordo com os artigos 40 e 201 da Constituição Federal, os regimes próprios (RPPS) e os gerais (RGPS) de previdência devem observar critérios que preservem seu equilíbrio financeiro e atuarial. “Sob essa premissa, qualquer alteração constitucional na definição de alíquotas, assim como na instituição da progressividade, exige a demonstração de razão suficiente e ordenada a uma finalidade (exclusivamente, custeio dos benefícios)”, diz outro trecho da inicial da ação da Adunesp, referindo-se à ausência de estudo atuarial na reforma paulista.

“O estudo atuarial é requisito formal para a regularidade material das condições previdenciárias em qualquer regime, em especial quando objeto de alteração constitucional”, prossegue o texto, especificando que é com base nele que são estipuladas as alíquotas dos trabalhadores e dos empregadores, entre outros requisitos e critérios previdenciários.

Penalização ampliada aos aposentados e pensionistas

A ação da Adunesp destaca que a reforma ainda gerou a possibilidade de aumento da base de cálculo da contribuição previdenciária dos aposentados e pensionistas, “em caso de déficit atuarial”, determinando que a contribuição previdenciária não mais incida sobre o valor da parcela dos proventos que supere o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social, mas sim sobre o montante dos proventos de aposentadorias e de pensões que supere um salário mínimo nacional. A medida foi regulamentada pelo Decreto 65.021, de 19/6/2020.

Assim como a implementação das alíquotas progressivas, o decreto declara, meramente, o déficit atuarial da Previdência, sem nenhuma apresentação comprobatória, valendo-se da crise social e sanitária instalada, para comunicar a nova cobrança contributiva para aposentados e pensionistas no prazo de 90 dias após sua publicação. Trata-se de “uma verdadeira redução dos proventos no meio da maior crise nacional já vivida”, frisa o texto.

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Cassação de liminar por Toffoli não impede ação

O Órgão Pleno do Tribunal de Justiça do Estado de SP (TJ-SP) concedeu liminar favorável a uma ação proposta pela Associação dos Procuradores do Estado de São Paulo (Apesp) e outras entidades que compõem o Fórum Permanente das Carreiras de Estado de SP, contra a vigência do Decreto 65.021, de 19/6/2020, que aumenta a base de cálculo da contribuição previdenciária nos proventos dos atuais aposentados e pensionistas autárquicos, e contra a supressão de imunidade constitucional parcial aos portadores de doença incapacitante. A liminar foi concedida em 8/7/2020.

No entanto, duas semanas depois, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, suspendeu a liminar do TJ-SP, remetendo a decisão para o julgamento do mérito da ação.

As advogadas da Adunesp explicam que a decisão de Toffoli não impede o ajuizamento de novas ações, como é o caso da iniciativa exposta nesta matéria.