SisCPA: o AI-5 da Unesp?

O ofício circular 03/2018 RUNESP, de conhecimento público, porque disponibilizado por vários diretores de unidade e coordenadores executivos, salve melhor juízo, intima esses dirigentes locais a pressionem os docentes que ainda não assinaram o termo de responsabilidade solicitado pela Comissão Permanente da Avaliação (CPA), que o façam. Nele são feitas várias afirmações que, da forma como são colocadas, adquirem um caráter de ameaça à instituição. Senão, vejamos o que diz a Assessoria Jurídica da Adunesp.

As justificativas apresentadas pela Reitoria para que todos assinem o termo de responsabilidade, baseadas numa condição futura e incerta, considerando a hipótese de que em eventuais e futuras ações trabalhistas contra a UNESP, a mesma não poderia se defender pois a “justiça brasileira somente aceita processos impressos quando acompanhados dos documentos de assinatura certificadas ou de termos de responsabilidade assinados pelos que utilizam o sistema”, são, no mínimo, bizarras.

A Reitoria agora apresenta nova justificativa para o encaminhamento. Quer justificar sua ação mobilizando todos os docentes da Universidade para contemplar hipótese futura, incerta e que se apresentaria de forma pontual. Não haverá nenhum impedimento na defesa da Universidade em caso de ações trabalhistas (que a Reitoria supõe que haverá muitas!!, a justificar sua conduta administrativa) se ela solicitar as informações, tempestivamente, a quem deve prestá-las no caso de uma ação trabalhista. Porém, estranhamente, ela mobiliza esforços de todos os docentes da instituição apenas considerando essa hipótese.

Nos parece uma falácia tal justificativa, o que reforça a importância dessa iniciativa. Outrossim, considerando como justa a justificativa apresentada pela Reitoria, nesse caso inexistiria obrigatoriedade de que os docentes aceitassem essa condição, respondendo, ou sendo identificados pessoalmente pelas informações que devem ser prestadas pela Universidade em caso de ações trabalhistas.

Questionamentos sobre o SisCPA

Implementado sem passar por qualquer instância colegiada da Universidade, o chamado SisCPA vai de encontro à deliberação do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (CEPE), na medida em que permite o acesso online à “produção” de todos, e de cada um dos docentes, o que configura um instrumento extremamente eficaz de controle do nosso trabalho e recoloca, de modo enviesado, a questão da avaliação individual, embora o próprio CEPE tenha aprovado por ampla maioria uma modalidade de avaliação tão somente do desempenho coletivo dos departamentos. Ele constitui um importante instrumento que poderá ser eventualmente utilizado para constranger, ou mesmopara punir docentes “adaptando” (rebaixando) o seu regime de trabalho às exigências de um planejamento estratégico calcado exclusivamente na contenção de despesas. Seria um modo eficaz de submeter a folha de pagamento da Unesp ao subfinanciamento a que estamos submetidos pelas políticas impostas pelo governo estadual, e contra as quais as sucessivas gestões reitorais, incluindo as atuais, não têm tido a necessária coragem de se contraporem. Senão, por que a Reitoria estaria tão preocupada com a adesão de docentes ao SisCPA? Qual a necessidade de se disponibilizar para a CPA o acesso online aos relatórios anuais e trienais de todos os docentes da Unesp?

A iniciativa da Reitoria de insistir que gestores locais pressionem os docentes a aderirem ao SisCPA - por meio doofício circular 03/2018 RUNESP - explicita o tamanho da importância que ela atribui a esse instrumento, o que nos leva a crer que se trata de algo que vai muito além de uma simples mudança “do suporte papel para o suporte eletrônico” e reforça sobremaneira todos os questionamentos elencados acima. Diante disso, fica patente a razoabilidade da deliberação da Plenária Estadual da Adunesp realizada no Campus da FCL-Araraquara, em 16/4/2018, que, reiterando decisões de Plenárias anteriores, orientou os docentes a não assinarem o Termo de Responsabilidade do SisCPA. Tratou-se, na época, de indicar uma ação política para que a categoria docente pudesse se contrapor a tudo o que representa o SisCPA, conforme as observações e ponderações acima. No entanto, evidentemente, essa indicação é de caráter coletivo e não deixa de considerar que, individualmente, qualquer docente que se sentir ameaçado ou inseguro deva tomar a melhor decisão que julgar adequada para salvaguardar a sua segurança administrativa e funcional.Certamente, ante a reação que tiveram, a reitoria e a CPA mostram grande preocupação com a resistência de 9,25% dos/as docentes que ainda não assinaram o Termo de Adesão. De difícil digestão para a administração superior da Unesp, a atitude desses/as colegas, representa um elemento importante de discordância com as políticas de controle e domesticação do trabalho docente - patrocinadas pela reitoria e pela CPA - no que diz respeito às suas consequências individuais e coletivas, e recoloca cada um de nós diante da seguinte questão, já respondida pela Plenária de Araraquara: qual é a opção mais adequada para salvaguardar a segurança administrativa e funcional de cada um de nós?

Não podemos deixar de mencionar também que o SisCPA, uma vez implementado, possibilitará não apenas um controle absoluto sobre as informações individuais de cada docente, mas, também, a exposição de todos os dados do usuário tanto para a instituição, quanto para a empresa conveniada e desenvolvedora do sistema, a Google, vínculandoos dados assim obtidos a uma empresa do setor de tecnologia informática cuja reputação é questionável no que diz respeito à segurança e à transparência no tratamento das informações pessoais. Conforme divulgado recentemente pelo Wall Street Journal, a empresa Google continua a permitir que desenvolvedores de softwares externos analisem as caixas de entradas de milhões de usuários do Gmail. As leituras podem ser realizadas de forma automatizada por meio de softwares ou por funcionários humanos. Isto é muito grave porque equivale a aceitar o risco de disponibilizar dados sobre a produção acadêmica da Universidade a uma empresa privada multinacional, que poderá fazer uso desta enorme quantidade de informação privilegiada para os fins que lhe aprouver, e sobre os quais não se tem o menor controle.

Paradoxalmente em relação a essa vulnerabilidade dos dados dos usuários do sistema, o termo de adesão imposto aos docentes pela CPA imputa ao docente individualmente total responsabilidade pelas informações disponibilizadas, submetendo-o as penalidades previstas pela lei e que, no limite, podem levá-lo à prisão.

Feitas essas considerações, a Adunesp vem a público, mais uma vez, para reafirmar a sua posição contrariaà atuação nefasta e arbitrária da CPA e conclamar todas as forças vivas da Universidade a lutar para que esta comissão seja vinculada ao CEPE, e não ao reitor, que se estabeleça uma forma mais democrática para a indicação dos seus membros, e que sejam suprimidas suas práticas arbitrárias, punitivas e intimidatórias sobre o corpo docente, e que a produção acadêmica da Unesp seja resguardada de possíveis usos indevidos tanto interna, quanto externamente (Google). 

Diretoria Central da Adunesp
São Paulo, 10 de julho de 2018.

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